20.2.06

O doce veneno


Saiu no Prosa & Verso do jornal O Globo:

“Bruna Surfistinha

O sucesso da ex-prostituta, que lançou há três meses “O doce veneno do escorpião”, uma versão condensada e mais profunda do blog que mantinha na internet, parece não ter limite. Seu livro, lançado pela Panda Books, além de virar filme, está sendo disputado por editoras do mundo todo, da Coréia à Alemanha. Na América Latina, vai ser editado pela Planeta — Bruna será em março um dos destaques do Salão do Livro de Buenos Aires — e em maio ela deve fazer um tour de lançamento pela Itália. Esta semana, o livro superou “Quase tudo”, de Danuza Leão, e agora lidera a lista de best-sellers, com 90 mil exemplares vendidos.”

O que venho escrever aqui é uma questão de julgamento de valores sim. Ora, tudo isso descrito acima é fruto de um livro escrito por uma ex-prostituta que trata de relatar suas experiências, enquanto ainda estava em atividade. E acabo de me lembrar que não existem ex-prostitutas, nem ex-gays, pelo menos era o que meu pai dizia — ou foi um e-mail que me disse isso? Bem, isso não importa. Até porque, não vejo nenhum problema numa ex-garota de programa escrever um livro e fazer uma autobiografia, como se o problema estivesse no fato dela ter sido prostituta. Agora, não quer dizer que esse texto é desprovido de algum tipo de preconceito, porque venho falar sobre um livro que não li, e tecer alguns comentários sem quase nenhum conhecimento do material abordado. Só tive acesso a alguns trechos, mas que corroboram para a minha opinião sobre esse fenômeno de vendas que é “O doce veneno do escorpião”. Uma opinião confusa e que não tem muita forma ainda, mas que reflete alguns questionamentos que tenho a intenção de compartilhar nesse texto. Antes de tudo, o que mais me incomoda nessa história toda é que o livro não passa de um “dei aqui”, “dei ali”, “gozei acolá” etc., que o espaço que ela tem na mídia é enorme, aparecendo no programa da Luciana Gimenez, do Gilberto Barros e outros. Dão espaço para divulgar seu livro e posam como se tivessem fazendo o seu papel para difundir a literatura. E cadê espaço para o pessoal sério, os que fazem literatura de verdade? Ah! Não é de interesse para eles. O pior é que eu entendo. Mas uma pergunta me vem a mente agora: será que os 90 mil exemplares vendidos não ajudam, pelo menos, a promover a leitura no país? Minha resposta vem de imediato quando lembro que, como no cinema, há filmes que não valem a pena serem vistos, pois não acrescentam em nada. Será que num país que não há muitas salas de cinema, que não é exibido muitos filmes, colocar qualquer filme para ser exibido só para que as pessoas possam ter mais contato com o Cinema, seria válido? Acho que não. O que me dá certeza na posição que tenho sobre essa questão é que “O veneno do escorpião” é apenas um produto para acarear maiores lucros. E é nisso que se mantém, não em qualidade literária. É apenas algo que está na moda, como uma música que faz sucesso num verão qualquer.